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“Estratégias Resilientes em Ambientes Geopolíticos Voláteis”

O que as empresas precisam fazer para adaptar modelos de negócio, redes de suprimentos e planos de expansão em um mundo cada vez mais fragmentado. 

Por: Carlos Eugênio Friedrich Barreto

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O Normal da Instabilidade – O mundo corporativo vive hoje sob o impacto de uma ordem geopolítica em reconfiguração. A invasão da Ucrânia, os conflitos recorrentes no Oriente Médio, a crescente rivalidade entre China e Estados Unidos, as instabilidades na África e América Latina e o fortalecimento de blocos como os BRICS redesenham fronteiras de cooperação, ameaçam cadeias globais de valor e expõem as empresas a riscos até então pouco previsíveis.

Esses eventos geram efeitos em cascata, tais como: alta inflacionária, tensões cambiais, escassez de insumos estratégicos, sanções econômicas, pressão sobre ESG e reconfiguração do consumo global. Diante desse cenário, empresas que desejam manter sua competitividade precisam sair da postura reativa e abraçar a estratégia da resiliência (WEF, 2024).

Na nova ordem mundial, resistir não basta – é preciso redesenhar.

De Estratégia Eficiente à Estratégia Resiliente – Durante décadas, a estratégia empresarial esteve ancorada na previsibilidade e na eficiência. A maximização de margens, redução de custos e a padronização global foram o norte. Hoje, a lógica se inverte: empresas resilientes são aquelas que conseguem adaptar-se rapidamente, diversificar riscos e antecipar mudanças (PORTER, 2018; OLIVEIRA, 2022).

A resiliência estratégica não é apenas capacidade de resistência, mas de evolução diante da adversidade. É a inteligência de redesenhar modelos e lideranças a partir dos sinais do ambiente (TALEB, 2013).

Resiliência organizacional não é robustez, é capacidade de adaptação sustentada.

Geopolítica e Cadeias de Suprimentos: Lições da Disrupção – O colapso de cadeias globais durante a pandemia e a guerra na Ucrânia mostrou a fragilidade dos sistemas ultradependentes de regiões específicas. Embargos, sanções e conflitos armados travam acesso a insumos estratégicos (como semicondutores, alimentos e metais raros) e geram um efeito dominó em toda a cadeia, podendo impactar o desempenho operacional das organizações (McKinsey, 2023).

A esse contexto somam-se as políticas de nacionalismo econômico intensificadas, sobretudo, no período pós-Covid-19 e sobretaxas comerciais. Os Estados Unidos, por exemplo, implementaram sobretaxas e sanções unilaterais contra países considerados “hostis” ou concorrentes estratégicos, como China, Rússia e Brasil, todos membros do bloco BRICS. Esse movimento vem afetando diretamente os fluxos comerciais, investimentos estrangeiros e operações multinacionais.

Empresas que operam em múltiplos países precisam, hoje, considerar os possíveis impactos das movimentações geopolíticas em suas cadeias de suprimento, adotando estratégias de proteção como:

•             Regionalização e nearshoring.

•             Estoque estratégico de insumos críticos.

•             Diversificação de fornecedores e logísticas.

•             Mapeamento de risco-país, compliance regulatório e tecnológico, sobretudo de IA.

Modelos de Negócio em Ambientes Fragmentados – A globalização clássica deu lugar a um mundo mais fragmentado, com diferentes blocos de regulação, moedas digitais soberanas e acordos comerciais excludentes. Isso exige adaptação profunda dos modelos de negócio capazes de responder a essa nova ordem (HBR Brasil, 2023).

Empresas globais estão migrando para abordagens multilocais, onde cada região exige uma estratégia própria, respeitando aspectos culturais, legais, ambientais e de segurança, aumentado a complexidade da operação.

Exemplos:

•             Indústrias automobilísticas criando fábricas gêmeas em regiões distintas para mitigar riscos políticos.

•             O setor farmacêutico buscando autonomia regional para produção de medicamentos essenciais.

Tomada de Decisão Baseada em Cenários e Inteligência Geopolítica – Em um ambiente de baixa previsibilidade, as lideranças precisam investir em ferramentas de antecipação e análise prospectiva, como:

•             Construção de cenários estratégicos (futuros prováveis, plausíveis e desejáveis).

•             Modelos PESTEL (considera as variáveis políticas, ambientais, sociais, tecnológicas, econômicas e legais) e matriz de risco-país.

•             Monitoramento de indicadores geopolíticos, energéticos e tecnológicos.

O apoio de consultorias estratégicas, think tanks (laboratório de ideias) e áreas internas de “risk intelligence” torna-se uma vantagem competitiva para decisões de expansão, alianças e novos investimentos.

Competências do C-Level para liderar em ambientes voláteis – O novo contexto demanda lideranças com habilidades não apenas técnicas, mas cognitivas, políticas e adaptativas, como:

  • Pensamento sistêmico.
  • Resiliência.
  • Capacidade de leitura de sinais fracos e por vezes difusos.
  • Tolerância à ambiguidade.
  • Agilidade na tomada de decisão.
  • Liderança colaborativa e inclusiva.
  • Adaptabilidade às pressões e mudanças políticas.

Cultivar essas competências exige formação contínua, escuta ativa e um modelo de governança mais distribuído e responsivo.

Conclusão: Da Reação à Antecipação Estratégica – As empresas que sobreviverão e prosperarão em um mundo geopoliticamente instável serão aquelas que não apenas reagem aos impactos, mas antecipam e constroem capacidade de resposta sistêmica.

Ações essenciais incluem:

•             Diversificar cadeias de valor.

•             Reposicionar estrategicamente unidades de produção e hubs logísticos.

•             Investir em inteligência de cenários.

•             Treinar lideranças para navegar em complexidade.

A Importância da Inteligência Artificial.

A IA surge como uma aliada estratégica nesse novo contexto. Seu uso pode:

•             Acelerar a tomada de decisão com base em dados em tempo real.

•             Reduzir custos operacionais e logísticos.

•             Melhorar a previsão de riscos e comportamentos de mercado.

•             Sustentar modelos de simulação e cenários dinâmicos.

Adotar IA não é mais uma opção tecnológica, é uma decisão estratégica mandatória a qualquer tipo de negócio.

A resiliência organizacional do futuro será digital, inteligente e adaptativa.

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Referências Bibliográficas

HBR Brasil. (Edições especiais) Estratégia e futuro do trabalho, 2023-2024.

McKinsey Global Institute (2023). Navigating geopolitical risk.

OLIVEIRA, Silvio Luiz de. Estratégia empresarial: fundamentos, processos e perspectivas. São Paulo: Atlas, 2022.

PORTER, Michael. Estratégia Competitiva. Rio de Janeiro: Campus, 2018.

TALEB, Nassim. Antifrágil: Coisas que se beneficiam com o caos. São Pulo: Objetiva, 2013.

WEF (2024). Global Risks Report.

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Carlos Eugênio Friedrich Barreto é consultor associado de Denize Dutra Gestão e Desenvolvimento na área de estratégia e gestão. Foi executivo da Shell Brasil, Texaco Brasil e em instituições de ensino superior. Há mais de 20 anos é professor em programas de MBA da FGV. Doutor em Ciências Sociais, Mestre em Administração, Especialista em Estratégia e Bacharel em Administração.

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